Turres Veteras (II)

25 maio, 2006

Mais um pouco de Código

Segue um texto, atribuído a Nuno Markl, que recebi no meu e-mail... é grandito, mas vale a pena ler... prometo que não vou fazer isto muitas vezes...

'O CÓDIGO DA VINCI - por Nuno Markl


O filme O CÓDIGO DA VINCI está prestes a estrear – e é incrível ver como este fenómeno tomou proporções incríveis. Eu desconfio que neste momento deve haver mais casas no mundo com O CÓDIGO DA VINCI do que com a Bíblia ou mesmo a Lista Telefónica. Há pessoas que quando precisam do número telefónico das pizzas consultam O CÓDIGO DA VINCI.
A sério. Eu acho que o livro foi comprado até por pessoas que não sabem ler. Acho que entre aquele número gigantesco de exemplares vendidos, boa parte deles não foram lidos – mas estão nas estantes de muitas casas e fazem boa figura quando se levam visitas lá a casa. “AH, VOCÊS TÊM O CÓDIGO DA VINCI?… NÓS TAMBÉM. POIS.”É claro que a conversa fica por aqui – ninguém troca impressões sobre a história porque, na verdade, nenhuma das partes leu o livro.
A verdade é que às tantas nem era preciso ler o livro – dezenas de outros livros surgiram para explicar o livro principal, todos eles com muito menos páginas. Obras com nomes como DESCODIFICANDO O CÓDIGO DA VINCI. Ou DESCODIFICANDO A DESCODIFICAÇÃO DO CÓDIGO DA VINCI. Ou ainda DESCODIFICANDO A DESCODIFICAÇÃO DA DESCODIFICAÇÃO DO CÓDIGO DA VINCI.
Acho que nunca se escreveram tantos livros sobre um livro. Toda a gente quis mamar dessa gigantesca teta – mesmo aqueles que diziam mal do livro. Eu próprio cheguei a considerar escrever um livro sobre O CÓDIGO DA VINCI, apesar de não o ter lido. Uma ideia lucrativa era um livro chamado DESCODIFIQUE VOCÊ MESMO O CÓDIGO DA VINCI. Espetava-se com a Gioconda na capa e o interior era todo em branco. 500 páginas em branco. E não estava a aldrabar ninguém: aquilo chamava-se DESCODIFIQUE VOCÊ MESMO O CÓDIGO DA VINCI. Que é como quem diz, pegue na canetinha e comece a escrever os seus pensamentos sobre o livro.
Com sorte ainda arranja alguém que lhe edite isso.Mas a verdade é que nesta febre apareceram livros com nomes do estilo A ALDRABICE DO CÓDIGO DA VINCI, feito por malta cuja postura era “eu sou contra o CÓDIGO DA VINCI, mas quero ganhar algum dinheiro à conta dele”, logo seguido de DESCODIFICANDO A ALDRABICE DO CÓDIGO DA VINCI e também de DESCODIFICANDO A DESCODIFICAÇÃO DA ALDRABICE DO CÓDIGO DA VINCI E TAMBÉM O PRÓPRIO CÓDIGO DA VINCI. Neste momento, uma pessoa pode abrir uma biblioteca municipal só dedicada a livros sobre O CÓDIGO DA VINCI.
Todas as semanas sai um novo, seja a dizer bem ou a dizer mal ou a querer explicar o livro. Neste momento acho que há escritores especializados no CÓDIGO DA VINCI – toda a obra deles é sobre O CÓDIGO DA VINCI. Escritores que daqui a pouco vão estar a lançar livros com títulos tais como MAIS DESCODIFICAÇÕES DO CÓDIGO DA VINCI, AINDA MAIS DESCODIFICAÇÕES DO CÓDIGO DA VINCI, ainda FALTAVAM-ME DIZER MAIS DUAS OU TRÊS COISAS SOBRE O CÓDIGO DA VINCI e, para terminar, o título JURO QUE ESTAS SÃO MESMO AS MINHAS ÚLTIMAS DESCOBERTAS SOBRE O CÓDIGO DA VINCI. Neste último livro, o autor já só disserta sobre a qualidade do papel em que O CÓDIGO DA VINCI foi impresso nas suas variadas edições pelo mundo fora.Ou seja, com O CÓDIGO DA VINCI abriu-se todo um mercado inexplorado – os livros sobre livros de sucesso. Tenho pena que ninguém tenha querido descodificar os meus livros. Nas páginas do livro do HÁ VIDA EM MARKL esconde-se por exemplo, entre linhas de texto e desenhos, uma magnífica receita de Toucinho do Céu. É preciso é sabê-la procurar.
Convém dizer àqueles que vão agora comprar o livro de propósito que isto é mentira – o HÁ VIDA EM MARKL não tem lá nada escondido.
É o livro mais transparente do mundo.Agora o filme de O CÓDIGO DA VINCI vai estrear, e lá vai vir a conversa do costume: ai que não sei quê, que o livro é melhor. Que falta muita coisa que vem no livro. Claro que falta – aquilo é suposto ser UM FILME, e eu não sei se vocês têm tempo, mas qualquer filme maior que três horas começa a complicar-me os horários. É que eu tenho muita coisa para fazer, e apoquenta-me isto de se estarem a fazer filmes cada vez maiores. Até a MISSÃO IMPOSSÍVEL III, que deve ter um argumento de 60 páginas, boa parte delas preenchidas com a frase “COISAS REBENTAM” e “ELES CORREM”, é um filme com mais de duas horas de duração!As pessoas queixam-se demasiado daquilo que vêem nos filmes. Se vão ver um drama intimista europeu, dizem “AH, É CHATO, EU QUERO É ACÇÃO”; se vão ver um filme de acção, dizem “AH, ISTO É SÓ TANGA, ISTO NUNCA PODIA ACONTECER NA REALIDADE”; se vão ver um filme realista dizem “AH, ISTO NÃO TEM FANTASIA NENHUMA E PARA REALISMO JÁ BEM BASTA A MINHA VIDA”; se vêem um filme fantástico dizem “AH, ISTO É MUITA FANTASIA, ISTO ASSIM É MUITA FANTASIA”.
Pessoal, decidam o que é que querem dos filmes!Para quem não leu, O CÓDIGO DA VINCI é um “thriller” que lança algumas teses bombásticas sobre uma série de assuntos – nomeadamente sobre a figura de Jesus Cristo – a ideia dele ter casado com Maria Madalena ou de ter filhos. É por isso que o Vaticano anda a dizer aos católicos para boicotarem o filme. Eles dizem que o filme só passa ideias perturbadoras. E por isso recomendam A PAIXÃO DE CRISTO.Que, como é sabido, é um filme livre de ideias perturbadoras.Tirando, é claro, a ideia perturbadora sobre aquilo que uma vergastada com anzóis faz à pele e à carne das costas de um indivíduo.Por cá, o José Rodrigues dos Santos escreveu uma espécie de CÓDIGO DA VINCI português – aquele livro que avança com a nossa própria teoria controversa de que Cristóvão Colombo, afinal, era um dos nossos. Um portuga. É claro que Cristóvão Colombo só tem em comum com Cristo as seis primeiras letras do nome – e talvez seja por isso que ninguém, em nenhuma parte do planeta, escreveu um livro a tentar descodificar O CODEX 632. O livro do José Rodrigues dos Santos é excelente, mas em termos de impacto mundial, digamos que “Cristóvão Colombo era português” não tem grandes hipóteses de competir com “Jesus Cristo foi casado e teve filhos”. Qualquer revelação sobre Cristo bate qualquer outra aos pontos.A única hipótese de uma revelação sobre Colombo bater uma sobre Cristo era se fosse qualquer coisa do género: “Quando Cristóvão Colombo descobriu a América estava a usar cuecas de renda, meias de rede e um cinto de ligas”.Sou capaz de escrever um livro sobre isso. Seja como for, ninguém vai conseguir provar o contrário, por isso…'
Codicologocamente vosso,
André